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O Clube do Livro foi uma experiência muito bem sucedida que reuniu alguns amigos virtuais que tem algo em comum: gostar de livros e de leitura. Durante algum tempo, neste espaço, falamos de livros, de temas e discutimos assuntos variados, sempre sob a ótica de estímulo à leitura e do amor pelos livros, sejam eles de que gênero forem.

O tempo e os afazeres de cada um, no final, acabaram por dificultar o prosseguimento da ideia inicial. Então, se você chegou até aqui, saiba que este blog deixou de ser atualizado, mas todo o seu conteúdo está disponível. Fique à vontade para explorar o que foi dito, ver os livros que lemos e discutimos, o que dissemos sobre eles. Enfim, tudo o que foi feito continua on line.

E obrigado pela visita.

Volta ao mundo em 8000 dias“Volta ao mundo em 8000 dias”, o livro que conta os 23 anos de aventuras de Paulo Rollo, como destacado na sua própria capa, é na verdade uma viagem em torno do eu. E isso não quer dizer que o livro não seja interessante. É. Só que ele se prende a detalhes, focado no aventureiro, não na aventura e, com isso, pelo menos no meu entender, perde um pouco do charme e do conteúdo que teria se o foco fosse a aventura, não a pessoa. Narrado na primeira pessoa, o livro nos apresenta o autor, quem é e o seu objetivo: viajar, conhecer o mundo, explorar lugares.

Na certa, a maioria de nós gostaria de fazer o que ele fez. E depois, tal como aconteceu com o aventureiro, relatar o que fizemos. E até pelo tempo em que passou nas suas viagens, certamente teria muito para contar. E efetivamente, contou, inclusive o seu olhar preconceituoso sobre povos e costumes, rotulando-os para, em alguns casos, até reconhecer que os entendia. Em outros, não. Por exemplo, em relação aos franceses, ou em relação à frieza dos europeus, inclusive os latinos. Talvez seja o caso de se perguntar se eles teriam de se enquadrar na cultura brasileira. Acho que não. E ao classificarmos eles com o nosso padrão estamos comparando e julgando coisas diferentes.

Um dado curioso do livro é o olhar do próprio aventureiro, atraído para coisas que um viajante comum não olharia. E muito menos tentaria. Nestes casos, o relato prende-se ao que ele fez e como foi feito. Os locais visitados e o que aconteceu apenas servem de pano de fundo para justificar o desejo de continuar viajando, conhecer novos locais, falar das passagens por ele, dos contatos feitos, mas nada – ou pelo menos muito pouco – sobre os próprios locais visitados.

De qualquer forma e ao final o que o viajante nos apresenta é um vasto painel de sua vida, do que fez, de como conseguiu visitar tantos lugares. O livro, neste caso, não é sobre os locais, mas sobre quem as fez. Uma escolha que se não o torna desinteressante, como já disse, faz com que seja superficial em muitos aspectos, deixando de lado o que é maior para apegar-se ao menor, como é o caso de dormir em um parque ou o de assumir a condição de sem teto, dependendo da caridade alheia para sobreviver e prosseguir.

Pode-se, no caso do livro de Paulo Rollo, fazer uma conexão com o filme Na natureza selvagem. Nele, como no livro, conta-se a história de alguém que optou pela aventura, por viajar sozinho, por conhecer lugares, por portar-se de forma diferente que a maioria. E o filme, além de focar o próprio personagem, dá vida ao que ele viu, ao que passou. As paisagens – seja a exuberância de um local ou a pobreza de outro – integram o filme, a história, tornando-a mais interessante. As paisagens viram persnagens e tão importantes quanto o próprio ator, Emile Hirsch, que fez o papel de Christopher McCandles.

Rollo, no caso do livro, é o centro de tudo e as aventuras, com os locais por onde passou, são pequenos coadjuvantes que apenas ilustram o que fez, mas não a própria aventura. O livro, no meu entender, poderia ser melhor, construído de forma diferente. Como está, não deixa de ser uma leitura agradável, que nos remete a várias partes do mundo e nos dá a visão de pequenos pedaços dos locais que o aventureiro visitou. Apesar disso, é – como já afirmei – uma leitura agradável, principalmente para quem gosta de viajar, de conhecer novos lugares, de viver coisas diferentes. As aventuras de Rollo nos levam a várias partes do mundo e, no final, nos diverte. Recomendo.

Nada de O Idiota ou de Dostoievsky nesta semana. Vou me permitir uma pequena mudança de foco e lembrar uma decisão tomada por este Clube há algum tempo, de permitir que autores enviassem, a um dos integrantes por ele escolhido, suas publicações e, delas, obtivesse uma resenha ou apreciação. Na verdade, com a decisão tomada, o único livro colocado à nossa disposição foi o do Paulo Rollo, um aventureiro brasileiro que narra as suas peripécias pelo mundo afora.

Fui, na época, escolhido ou me dispus a receber o livro, lê-lo e dele fazer um comentário neste espaço. Por várias razões, que não cabe aqui alinhar, esta leitura foi colocada de lado. Mas como assumi o compromisso, tinha de a fazer em algum momento e o momento é agora. Enfim, estou lendo Volta ao Mundo em 8000 Dias e queria deixar aqui minhas primeiras impressões.

Para quem, como eu, gosta de viajar a leitura está interessante. Afinal, Rollo relata, mesmo que de forma muito rápida e sem detalhes, sua passagem por várias locais, cidades, vilarejos e mostra os problemas enfrentados para chegar, ficar e continuar com as suas viagens, indo de hotéis de luxo a dormir no carro ou, mesmo, em um local aberto, como um parque. O livro fala, também, de relacionamentos, que podem ser fáceis ou difíceis, dependendo de para onde se viaja.

Um dos pontos que identifiquei e que, no meu entender, é um dos pontos fracos do livro é sua superficialidade – pelo menos até onde li. Tudo é colocado na primeira pessoa e os locais e as aventuras, na verdade, são panos de fundo para que fale dele, do que sente, como vê o mundo. E algumas dessas visões denotam claramente preconceitos e consagra estereótipos.

Sim, a leitura é interessante, apesar dos pulos que o levam de um a outro local e tempo. Mais? Vou voltar ao assunto, assim que concluir o livro.

Encerrado um ciclo, como já observei em Início de um, …, começamos um novo. O que posso dizer é que o livro já chegou e já comecei a lê-lo, mas ainda estou bem no início, o que não me permite fazer um julgamento, nem comentários relacionados ao seu conteúdo.

Li, no entanto, que um dos personagens de O Idiota tem muito do próprio Dostoievsky, que o tornou meio autobiográfico. De início o livro nos apresenta a um cenário um pouco diferente quando imaginamos príncipes e a realeza. Afinal, mostra-nos, logo de cara, um príncipe pobre e um rico cínico, que nada vê na família a não ser a possibilidade de dispender o que seus pais acumularam.

Pelo que me pareceu – e é uma impressão muito inicial – o livro se prende aos relacionamentos e como eles eram construídos e desenvolvidos em uma Rússia que era muito desigual, colocando de um lado os que tinham muito e, do outros, subjugados, os que tinham pouco ou nada tinham. Neste aspecto, o panorama mostrado em O Idiota não difere muito do dado por Babel em A Cavalaria Vermelha.

O que chama a atenção, embora possamos ver identidades, é o tipo diferente de prosa. Enquanto Babel foi conciso, econômico mesmo, isso não acontece com Dostoievsky, que prolonga suas descrições, criando inicialmente todo um clima que leva ao primeiro relacionamento do livro. Se fôssemos comparar, seriam dois ou três contos de Babel. Em O Idiota é apenas uma introdução.

Pelo início o livro parece interessante. Agora, é continuar a leitura para constatar, no final, se a primeira impressão é ou não verdadeira. Ao término, podemos até não gostar do que lemos, mas não há dúvida que o autor é um dos grandes nomes da literatura mundial.

O fim pode, sempre, ser o começo de um novo caminho. Aqui, neste clube, isso tem se tornado realidade, pois a cada vez que terminamos um livro, começamos outro. E agora estamos, mais uma vez, repetindo o feito, com uma pequena diferença: não vamos trocar de literatura, que continua sendo a russa, de um grande escritor como Dostoievsky.

Acho que neste período de leitura de A Cavalaria Vermelha praticamente tudo o que havia para ser dito sobre o livro, já o foi. No final, pelo menos no meu caso, fica o gosto de, mais uma vez, ter participado da leitura de uma grande obra, não só por ser reconhecida como tal, mas principalmente por nos dar uma perspectiva totalmente diferente do que foi uma guerra, com toda sujidade e crueldade que envolvem seus participantes.

Foi uma bela experiência ter relido Babel. Até por tê-lo feito há um bom tempo, retomei o contato com a sua prosa e com as descrições de batalhas e o mergulho na alma dos humanos, retratada em alguns dos personagens, fossem eles soldados, padres, judeus ou até inimigos. O livro nos mostra como podem ser diferentes as abordagens de personagens, os relatos de uma ação e, sobretudo, nos dá uma visão diferenciada da guerra, de como as pessoas nela se portam.

Superamos a guerra e, agora, iremos entrar em outro campo. Confesso que minha experiência com Dostoievsky não foi boa. É dele um dos poucos livros que não consegui ler até o final: Os irmãos Karamazov. Não consegui. Mas isso foi em outro tempo e O Idiota irá, agora, me proporcionar  retomada deste contato, o que faço sem nehuma idéia preconcebida e espero que, tal como aconteceu com todos os outros livros já lidos neste clube, tenha uma leitura muito agradável.

A propósito, já recebi o livro, que é bastante substancial. Olhei apenas sua capa, sopesei-o e coloquei ao lado de minha poltrona preferida para iniciar logo a leitura. E tal como aconteceu com os outros livros, como sou o primeiro a falar deles, irei contando, aqui, a minha nova experiência com Dostoievsky.

Um dos pontos de destaque na maioria dos contos que compõem A Cavalaria Vermelha é, sem dúvida, a violência. A sua presença é, de certa forma, naturalizada pela brutalidade da guerra, da luta que se estabelece entre russos e poloneses e que se reproduz no clima que marca a relação das pessoas que participam da luta, seja nas batalhas físicas ou nas analogias traçadas ao longo dos textos construídos por Babel.

“(…)Já não há abelhas em Volin. Nós profanamos suas colméias, destruindo-as com enxofre e pólvora”, decreta Babel logo no início de “O caminho para Brodi”, completando que “a crônica de nossas atrocidades rotineiras” o oprime sem trégua, como uma doença do coração. O autor pode não gostar dela, mas a violência está presente, seja no trato com as abelhas, profanadas, seja no trato com as pessoas, que são mortas, sejam nas batalhas, quase sempre sangrentas. E se as abelhas podem ser profanadas, o que dizer das pessoas?

Em “A morte de Dulgochov” não são as abelhas, mas as pessoas, incluindo os combatentes, que sofrem nas batalhas. E o que dia Babel como exemplo? Ao relatar a situação de um combatente, assinala: “(…) ergueu lentamente a camisa. Tinha o ventre destroçado, as entranhas pendiam-lhe sobre os joelhos, as batidas do coração eram visíveis”. Imagine a cena e a brutalidade nela contida. Já em “O comandante da segunda brigada” o relato se prende novamente ao combate, mas também à forma de agir de um novo comandante que, intéprido, enfrenta o inimigo. Dele, afirma: “Procura a glória, e espero que a alcance”. Neste caso, que tipo de glória?

A violência se faz presente também no cotidiano, fora da guerra, como na história de Matvei Pavlichenko, ao destacar em uma das passagens o espacamento do patrão, concluindo: “E foi aí que conheci completamente o que é a vida”, com a brutalidade que marca as relações no campo, envolvendo patrões e empregados. Ou no comportamento errático de um cossaco, em Prischepa, que foi de vizinho em vizinho deixando um rastro de sangue. No final, “apunhalou mulheres velhas, pendurou cães sobre poços e emporcalhou ícones com excrementos de animais”. Uma descrição nada poética.

Estes são apenas alguns exemplos do recheio de violência que os textos curtos de Babel traz. Parece que ele esmerou-se em relatar não só o que viu, no que tomou parte, mas decidiu registrar, também, as histórias paralelas à guerra, envolvendo personagens que dela participaram junto com ele. Nos dois casos, a tônica é a violência, causada não só pela impieadade das lutas feitas por soldados amedrontados e mal nutridos, mas provocada pelo próprio relacionamento entre os vários personagens, seja em função de uma cadeia de comando, seja marcada pelo companheirismo e, em alguns momentos, pela amizade.

O que se conclui? No meu entender, que Babel quis, de fato, ser realista em relação ao que participou, colocando nos seus textos todos os horrores da guerra. Com isso talvez tenha querido chamar a atenção para a sua brutalidade e para o despropósito de algumas ações. O seu relato, no final, foi tão bem feito que o livro resistiu ao tempo. E ainda hoje pode ser lido, trazendo-nos um relance do que é uma guerra, que só é asséptica na televisão.

Acho que não percebi isso da primeira vez que li A Cavalaria Vermelha. Talvez tenha sido decorrência do tempo, da maturidade ou sei lá mais o que. O fato é que agora me sobressai, a partir do avanço da leitura, o olhar preconceituoso de Babel e ele se detém, inclusive, sobre o seu próprio povo, os judeus.

É verdade que ele era um revolucionário, marxista, o que significava, pelo menos para o consumo do partido e externo, que era ateu. E talvez seja para demonstrar isso que em várias passagens do livro ele acaba zombando da religião, sobretudo nas referências aos padres – ortodoxos ou católicos – e às crenças dos próprios soldados, educados dentro de uma marcante religiosidade russa. Quando se detém nos judeus, no entanto, seu olhar muda.

Logo em um dos primeiros contos, ao falar do espaço ocupado pelos judeus, ele o relaciona com a sujidade, mandando-os limpar um quarto onde ficaria. A partir daí as referência são sempre feitas com base em um olhar preconceituoso, seja pela pretensa usura, seja pelo tipo de comérciou e até pelas próprias práticas religiosos. Não é, no meu entender, um olhar simplesmente crítico. Mas sim fruto de um estereótipo construído em torno dos judeus, do que são e do que fazem.

É certo que Babel relata a crueza da guerra, mostra como o povo vivia, as misérias das próprias tropas e a extrema violência que marca não só a relação entre os próprios soldados e desses com seus comandantes, mas e principalmente em relação aos poloneses, que combatem. Mas para o “inimigo” às vezes ele até tem um olhar condescendente, como ao contar a história das pinturas sacras que reproduzem as pessoas do local.

No que se refere aos judeus, não. Ele embora os tenha procurado em algumas ocasiões, apresenta-os de forma muito, muito pejorativa e reproduz – o que talvez até seja compreensível – os estereótipos da época, que fala em usura, em exploração, etc. O fato é que, sendo judeu, Babel não tem uma visão positiva de quem também o é. Nem do comportamento, nem das crenças, mesmo aproveitando-se de um encontro para comer e beber.

O fato de o preconceito estar explícito, não faz com que a literatura de Babel seja menos importante. Enquanto arte, a literatura não tem a obrigação de ser politicamente correta. Acho que até pelo contrário. O que fica evidente, no entanto e no meu entendimento, é que a literatura acaba refletindo os pontos de vista de quem a produz. E acho que isso aconteceu com Babel.

Não sei se disse, mas no meu caso – como no do Álvaro – A Cavalaria Vermelha é uma releitura. Mas como aconteceu com O Admirável Mundo Novo, ele foi lido há muito tempo, o que leva a uma redescoberta com a releitura. De todos os contos do livro, o que mais me lembrou é de A Carga de Cavalaria, que considero excepicional, mas que deixarei para cada um descobrir se é mesmo assim e se lhe agrada.

Sobre o livro e a sua época o Alvaro já falou, e bem. Também sobre ele e as traduções a Scliar deu um belo parnorama. Então, o que nos resta, agora, é começar efetivamente a discussão do seu conteúdo. Desta vez, no que se refere à minha leitura, ela está sendo feita de forma bem lenta. E com isso, estou mudando de tática, pois quase sempre leio um livro de forma contínua, até terminá-lo de uma vez.

Estou,portanto, me contendo e apreciando os pequenos contos, relembrando a leitura e descobrindo novas facetas que me passaram despercebidas. Não sou um leitor de autores russos e, confesso, meu contato com eles foi meio conturbado, graças a Dostoievisky. Também não sou um leitor assíduo de contos. Assim, Babel e seus contos tornaram-se exceções. E que bela exceção. Os contos são muito bons, principalmente, no meu entendimento, pelo retrato cru que faz das disputas na Rússia de então e do clima existente nela.

O que a Lys muito bem lembrou é que, apesar de revolucionário e de falar da revolução, A Cavalaria não pretende fazer história, mas literatura. Se Babel relatou suas experiências, o que viu, pode até ter se prendido a aspectos históricos – o que efetivamente fez – mas esse não era o seu enfoque. O livro deve ser apreciado, como chamei a atenção no post que inaugurou a sua discussão, como literatura. E foi por ser assim que sobreviveu às perseguições e censura do regime soviético.

Então, vamos apreciar a leitura.

Isaac Babel em uma de suas últimas imagensUma etapa foi vencida, outra começa. A Cavalaria Vermelha, que começamos a ler, revela, sem dúvida, um novo mundo. E acho que, no final, ele é bem mais cruel do que o universo de Sam Spade e das tramóias de figurões que andavam à procura de fortuna fácil e para consegui-la eram capazes de assassínio. O mundo de Isaac Babel, que escreveu A Cavalaria…, não era menos violento. Os contos mostram isso, com justiça sendo feita com as próprias mãos, traições de companheiros e, sobretudo, a crueza que preside qualquer guerra, seja a moderna, com enorme aparato tecnológico, seja a antiga, onde as disputas se resolvem, mesmo, com homens enfrentando-se  – e matando-se – a cara a cara.

A violência que preside A Cavalaria Vermelha não é edulcorada e nem bem educada. É fria, cruel e retrata uma situação em que ninguém gostaria de estar. Mas este, na verdade, não é o aspecto que quero abordar ao inaugurar a semana de nova leitura. Isaac Babel, como lembra bem Roniwalter Jatobá, o tradutor da versão que estou lendo, foi um revolucionário, participando da Revolução Russa e das guerras que ela travou, como soldado e como Comissário Político, um representante do partido junto às tropas, que cuidada da pureza ideológica delas.

Amigo de Trotski e do próprio Lênin, Babel, como todos devem saber, acabou preso no regime de Stálin e morreu na prisão, na Sibéria. Antes, talvez na tentativa de salvar sua vida, acabou repudiando o que escrevera em A Cavalaria Vermelha. O livro acabou sofrendo censura do regime soviético, que cortou passagens deles que se referiam àqueles que o stalinismo queria apagar. E acabou saindo de circulação na então União Soviética. Alé de apagar o homem, fisicamente, o regime queria matar a sua literatura.

O que aconteceu com Babel, pelo menos do ponto de vista de sua literatura, foi exatamente o contrário do que o regime soviético queria. Trazido para o Ocidente, A Cavalaria Vermelha foi não só editado, tornando-se conhecido, mas a literatura de Isaac Babel passou a ser elogiada e admirada. A linguagem crua, em todos os seus sentidos, que mostram a violência da guerra, mas não deixa de a olhar com um olhar sentimental, fez sucesso e consagrou o escritor russo como um dos grandes da literatura. O que ele disse, escreveu e pensou, permaneceu. Ao contrário da ditadura soviética, que acabou caindo.

Graças a essa permanência – que venceu a censura e o olvido de um regime que era mestre em apagar o que não lhe agradava – é que estamos iniciando a leitura de A Cavalaria Vermelha. Não foi a minha opção, pois preferia reler Hiroshima. Mas a escolha é ótima e Babel merece ser lido, não só como forma de tomarmos contato com a guerra e seus horrores, mas sobretudo por ver como um país conseguiu mudar de regime e o que pensavam dessa mudança os vários personagens.

Uma boa leitura para todos nós.

Livros, clube e o prazer da leituraTerminado O Falcão Maltês, que li ao lado de outros livros, que já tinha iniciado, fique pensando no que escrever para o fechamento das discussões sobre o noir americano e sobre os livros, de um modo geral. Ao refletir, retornei ao início deste clube, com a proposta de, a intervalos regulares, lermos e discutir um determinado livro, escolhido entre três indicações de um dos participantes do Clube. Brilhante idéia da Lys a que aderi de pronto, não só por gostar de livros, mas por ver no Clube uma oportunidade de diversificação de leitura.

Tiver a honra de inaugurar o clube, fazendo a indicação de três clássicos da ficção científica, um gênero por que sou apaixonado. A patir de Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, começamos um caminho que já teve percorrido um bom trecho, mas que não aponta um término. O que se pode dizer, não como um balanço, mas como uma visão panorâmica é que, em primeiro lugar, o Clube tem cumprido o seu papel, permitindo que cada um dos participantes amplie o seu horizonte de leitura, descobrindo novos gêneros, novos nomes, novos tipos de livros e, com isso, ampliando sua informação.

Se olharmos bem, vamos constatar que cada livro nos traz um novo mundo. Se de início discutimos engenharia genética – um tema árduo – e a possibilidade de construção de um novo homem, passamos, também, pelo mundo da mulher e o seu papel nele, enveredamos pelo misticismo, juntando crenças e vendo o retorno de um espírito, desvendamos um relacionamento incestuoso, tivemos um retrato da Inglaterra, puritana e mundana, ao mesmo tempo, vimos as loucuras de um alienista, a adulação aos poderosos e desaguamos no universo policial, de homens duros e maus, de palavras cortantes e de um suspense que nos leva a uma leitura de tirar o fôlego e nos apronta uma bela surpresa no final.

Cada livro, reafirmo, nos introduziu em um mundo diferente, gerando expectativas e fantasias que não teríamos se não os lêssemos. E ao lado de irmos para paragens que antes não percorríamos, ainda pudemos desfrutar, no processo de leitura, de visões múltiplas, que nos chamam a atenção para detalhes que deixaríamos despercebidos e que aguçam, ainda mais, o prazer de ler. A leitura deixou de ser um ato individual, solitário, e passou a ser compartilhada, discutida, com cada um mostrando pontos que destacam um livro, uma situação, e muitas vezes os ligando ao mundo real, que, de certa forma, acaba se transportando para todas as leituras feitas.

Se compararmos a trajetória das leituras com uma rodovia, poderíamos dizer, levando em consideração o que foi lido, que percorremos um caminho cheio de beleza, mas ao mesmo tempo complexo, algumas vezes assustador, outros – para alguns – meio entendiantes, mas que provocou muito mais excitação do que comedimento. E no final desta jornada, que está apenas se iniciando, fica a certeza de termos frequentados mundo díspares, muito diferentes, mas que, no final, se ligam no prazer de ler, no cultivo ao livro, no desejo de conhecer novos autores, de partilhar o conhecido e sobretudo de, juntos, continuar a caminhada sempre em busca de um novo e fascimento mundo, como será, sem dúvida A Cavalaria Vermelha.

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